quinta-feira, 12 de março de 2015



Escrevo com o ego ou com o coração? Às vezes, é difícil saber. Prefiro palavras honestas, mas as letras envaidecidas são muito atraentes, mesmo que nem sempre tão verdadeiras.

E assim seguia a vida daquela moça. Ela não tinha certeza se era mesmo feliz. Sentia-se plena em muitos momentos, é verdade. Não dá pra negar isso de jeito nenhum. Porém, logo começava a sentir aquele temor. Não era aterrorizador. Era um temor persistente do tipo que não machuca, mas incomoda sem parar, sabe? Feito dorzinha chata que não vai embora. Era assim: se ela ficava feliz simplesmente porque o céu, naquele dia, estava azulzinho, de “Brigadeiro” mesmo (sim, porque ela era capaz de extasiar-se com essas delicadezas), logo surgia, sorrateiro, o temor com a lembrança de um dos problemas que ela estava enfrentando. Como um despertador inconveniente dizendo que era proibido ser feliz ali, naquele instante. E ela achava aquilo tão irritante!  Quase beirava a tristeza, se ela realmente permitisse. Às vezes, era vencida. Em outras, nada a desmotivava daquilo que muitos insistiam em chamar de ilusão. Mas que ela sabia ser, na verdade, sua verdadeira essência. Graças a Deus.

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Minha manhã de domingo

O domingo começou cedo. A luz era de uma amarelo-alaranjado que aconchegava feito o colo quente da minha avó Leonor. Estávamos naquela praça arborizada, com coreto no meio. Havia verde fresquinho, bancos de madeira, aromas da infância, sabores de saudade. Havia artistas expondo quadros, esculturas, artesanato, bijuterias, enfim, gente feliz vivendo de talento. Havia criança correndo, pulando, pedalando. Ingênuos alegres. Havia uma roda de samba. Havia Samba de raiz da melhor qualidade. Ensaiando um chorinho. Havia Noel Rosa. E Noel Rosa numa manhã amarela de domingo é o paraíso na Terra. Um ensaio da felicidade. Estávamos ali, todos nós, a família em família. Alegres Ingênuos. Não havia melhor lugar, nem momento mais fácil pra ser feliz. Meu refúgio, meu porta-retrato. É prá lá que eu volto nos dias em que morro.  

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Carta


Não sei bem como começar esta carta, mas creio já ter começado, não é? Pois bem, então, como vai você? A família, os colegas de trabalho, os amigos, os inimigos? E os meus cachorros que ficaram aí contigo? Como vão as minhas coisas?

Aqui estou vivendo de repente. Tudo acontece. Nada é programado.

Acordo cedo, mas só porque o corpo pede. Ele é quem manda. Faço exercícios ao ar livre. Me alimento de pensamentos inatos. Durmo com sonhos alheios e desperto com pesadelos próprios. Sim, os malditos vieram comigo. Pensa que é fácil escapar?
Mas um dia eles morrem. Tenho fé.

Mesmo assim, consegui abrir um vazio enorme para preencher de descobertas, novidades, conhecimentos, curiosidades, simplicidades, facilidades. Vida nova. Nova vida. Com cheiro de dia começando, fresquinho. Ar purificado. E muita água corrente, que traz e leva. Não pára, sabe? Cansei de água parada.

Também tem lugar para novas pessoas. Sem preconceitos, predeterminações, predestinações. Sem pré nenhum. Ah, e sem pressa. Agora o tempo é meu amigo. Não nos cobramos, não nos atormentamos. Há respeito entre nós. Só assim podemos conviver e quem sabe, um dia, até sermos felizes juntos. Tudo é possível agora.

Tem espaço para cores berrantes e calminhas. E para as mescladas. Os sabores que picam. E os que derretem. Tem lugar de sobra para aromas, cheiros, odores oriundos. Tem um canto quente e uma aresta gelada.

Reservo ainda uma esquina sem desencontros. E caminhos abertos que me levarão às ruas, estradas, rios, mares, cidades e países que esperam ansiosamente por mim. E onde deixarei percepções, sensações, arrepios, delicadeza, volúpia. Sentimento.

Tem um lugarzinho bem apertado para o medo. Porque assim ele me protege sem me machucar. Para a tristeza também não dou moleza. Ela já quase não vem mais.

O amor já se instalou. Na verdade, foi ele que me aconselhou a buscar a felicidade. Eu a vejo sempre. Visitamos-nos com freqüência e estamos convivendo muito bem. Ela traz consigo a simplicidade, que me tranqüiliza. E a facilidade. Nada é tão fácil, ela diz, sempre que me abraça.

Como você pode ver, tudo está bem por aqui.
Aprendo vivendo. Vivo aprendendo.
Vem pra cá comigo!

Um beijo.


(*) Publicado originalmente neste blog em fev./2008

sábado, 24 de maio de 2014

O que eu quero? O que quero é tanto... Não cabe aqui. Um tanto que aparenta nada. E me preenche. Porque o que eu quero, de verdade, nem sei ainda como se chama ou pronuncia. É feito de serenidade e contentamento. Ser o que sou. Sem vestígio de aversão. Inteira. Pronto, é isso. O apenas e o todo. Respondi a sua pergunta?

(sem ilustração)

domingo, 2 de dezembro de 2012

De volta


O mesmo livro, dois dias depois, nova fábula. Palavras não envelhecem. Mudam seus contornos, ininterruptamente. Transitórias, mutantes em si mesmas. Não criam. Reciclam ideias. Evoluem em formas inéditas. Transbordam copos. Seguem cursos aleatórios. Buscam espaços disformes, incógnitas. Lugares não imaginados. Esquadrinham novas imagens para padrões ora enfadados. Reinventam antigos vocábulos. Cunham novos significados. 

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Que Deus te abençoe com felicidade

Há alguns poucos meses, ela perguntou se eu conhecia alguém que tivesse chegado aos 100. Eu assenti. E era verdade. Mas eu sabia também que não seria esse o seu caso, dadas as circunstâncias em que se encontrava. Sua saúde de ferro tornou-se, no fim, o seu maior carrasco. De fato, raramente ficava doente. E o médico não cansava de afirmar que seu coração (de mais de 90 anos!!!), era forte como de uma menina... Mas seu corpo estava exaurido. Ela já não andava e nem comia sozinha. Precisava de ajuda nas necessidades mais básicas. E tinha momentos de lucidez mesclados ao que prefiro classificar como “estado de quimera”, quando revivia momentos bem-aventurados. Minha avó era uma mulher triste. A vida toda, ou pelo menos no período que eu presenciei, ela foi sorumbática. Claro que teve dias afortunados, assim como as pessoas felizes têm seus tempos melancólicos. Suas amarguras não foram em vão, importante frisar. Uma vida marcada por algumas perdas trágicas, dores e abandonos. E, claro, houve ocasiões gloriosas e de amor. Porque mesmo com toda a sua agonia e solidão latente, havia, vez ou outra, uma certa ternura que eu encontrava num olhar. Ou em um sorriso raro. Mas no “conjunto da obra”, sei que pesou mais o desgosto. Tem gente que é assim mesmo: não sabe como amar, mesmo com muito amor pra dar. Não consegue ser feliz, mesmo com a felicidade morando ao lado. HOJE ELA SE FOI. Uma morte calma, ou pelo menos é o que me pareceu. A respiração foi diminuindo, lentamente. Até que parou. Sem sobressalto. Ela desistiu de chegar aos 100 anos, mesmo faltando pouco. E sabe, prefiro acreditar que decidiu ser a hora de soltar as rédeas. Pela primeira vez. E, enfim, ser feliz. É o que mais desejo, o que mais espero, o que mais peço!

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Porque


Porque o desejo da alma foi atendido. O sonho sonhado. A vontade alcançada. O voo voado. Porque sinto o êxtase brilhando na minha própria serenidade. Porque assim notei a ausência dele. Na verdade, não percebi o momento exato em que o medo se foi. Deixou um vazio despretensioso. Um vácuo respeitável. Um lugar fechado pra balanço, em reforma. A terra onde planto a mim. Porque é onde adubo você.